Minha tela começa a pipocar de fotos de amigos com suas caras de agora em comparação com a de dez anos atrás. Muitos deles não mudaram nada, nadica. Se dissessem que as duas fotos foram tiradas na mesma semana, acreditava fácil. No máximo uma armação de óculos diferente, uma câmera de melhor qualidade. Como pode? Quem são e como vivem essas pessoas que permanecem com as mesmas caras que tinham há uma década, mesmo corte de cabelo, um senso estético para roupas que não mudou drasticamente de lá para cá?
As transformações do lado de dentro costumam ser as maiores, mas são as mais difíceis de enxergar.
Por isso, prefiro fazer a comparação em palavras. Até porque nem que me paguem vou voluntariamente mostrar na internet uma foto minha de 2013.
Até esbarrei com essa minha versão do passado — em um vídeo antigo em que explico algumas opções ao Google Reader, no momento em que o Google tinha acabado de anunciar que ia encerrar a ferramenta, o que por si só já é um achado arqueológico. Eu ainda não fazia ideia do divisor de águas que isso seria na internet e na minha forma de escrever dentro dela. Para completar, estou fisicamente outra: cabelo tingido de vermelho, alisado, a pele mais escura ainda carregando vestígios do sol do Cerrado e um figurino questionável para dizer o mínimo. E o que mais me espantou: uma insegurança enorme impressa na voz.
2013 foi o ano em que cheguei em São Paulo. Trabalhava como redatora de conteúdo, escrevendo o que me mandavam escrever, homeoffice muito antes de ser modinha, ganhando pouco e levando alguns calotes, mas fazendo o possível para não precisar voltar a trabalhar em ambiente de agência. Eu já escrevia ficção, meu blog já era consideravelmente bem acessado e, ainda que eu não soubesse, já estava no processo de me tornar — profissionalmente — uma escritora.
Dez anos depois, estou no meu primeiro ano vivendo na Alemanha. Aprendendo alemão e me comunicando bem em inglês, escrevendo um terceiro romance e vivendo do meu trabalho como artista. Talvez eu esteja em um momento parecido com o que vivi há dez anos: perdida numa cultura diferente, me ajustando a uma nova cidade, construindo do zero novos laços afetivos, escrevendo em um blog (ele nunca morreu!) e me expondo na internet, sem a mais puta ideia de onde (ou como) estarei em 2033.
Tá meio igual, mas tudo mudou. Talvez feito as fotos dos meus amigos.
Uns que comentam “saudades colágeno” e nem acho uma grande perda não. É um bom negócio trocar colágeno por um bocado de confiança. Idade nos cai bem. É mais tempo para nos acostumarmos a quem somos e ficarmos mais confortáveis aqui dentro. Os fios brancos também vão ficando um charme.
Olhar para quem fui e onde eu estava em 2013 me deu a consciência de que muito do que sou hoje começou ali. Então olho para mim mesma hoje e enxergo o início de outra história, que nem consigo imaginar onde vai dar, o que talvez seja a condição ideal para chegar em um lugar realmente excitante. Escrever também é assim.
“Escrever é como dirigir um carro numa estrada, à noite. A gente só vê até onde a luz dos faróis alcança, mas é possível fazer a viagem inteira dessa forma.”
E. L. Doctorow
Uma resposta para “Desafio dos 10 anos”
Faz um desafio de 3 anos para mim e já vou ser outra! Entre 3 a 5 anos vence a validade da minha estabilidade emocional e preciso urgente de renovação. Adoro as fotos que me lembram o quanto caminhei. E adorei teu registro da revista, mudar é bom demais.