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Eu sou muito é trouxa.
Estava aqui preocupada de não ter decidido que escrever, e ai meu deus que passou de 57 de março e ainda não escrevi nada novo, mas são tantos temas, tantos assuntos, tantas coisas na cabeça que só de pensar em como organizar isso num texto coerente ia me levar uma tarde inteira (levou mais que isso), tudo para um texto que talvez ninguém leia, e, se ler, vai guardar para si, deixar afundar no silêncio ou ser soterrado por uma avalanche de informação mais interessante, afinal temos que andar logo com isso porque PRECISO atualizar minha timeline para ver se mais algum bebê nasceu dos meus amigos nos últimos trinta minutos.
Talvez eu só precisasse ser rápida, mandar um e-mail com um oi, olha só o que estou fazendo, só queria te mostrar isso e isso, rápida e verdadeira, é isso; porque ninguém tem mais tempo e eu não tenho mais paciência para essa eterna burocracia que têm sido as relações, em que temos que usar essas máscaras e cumprir esses papéis e protocolos para mantermos contato, mas sem nos aproximar demais porque cansa, né?
Toda essa preocupação com o que escrever (e se seria interessante ou não) quando eu só queria ter uma conversa franca, puxar uma cadeira, te convidar para sentar e ter um papo sincero, enquanto lá fora é um eterno 1º de Abril por todos os lados. Mas quando não é 1º de Abril na internet? Quando não temos alguém ocupado com as engrenagens de inventar mentiras ou editar a verdade para apresentar algo que consiga mais likes, mais audiência, mais reconhecimento? Honestidade não faz muito sucesso.
Nessa minha longa experiência com Comunicação, percebi que, para quanto mais gente você fala, mais você precisa ser superficial e neutro. Para conseguir o entendimento de mais pessoas, é preciso nivelar o discurso por baixo, e é isso o que a TV faz há eras e que o Youtube, que seria um espaço revolucionário, também começou a fazer. Tudo pela audiência.
Não vou mentir: é um bocado frustrante saber o que fazer para ter mais evidência, mais gente seguindo (o que não necessariamente significa mais leitores), mais participação em espaços relevantes, ou em que estilo ou qual tipo de assunto escrever para ter mais compartilhamentos ou mesmo mais livros vendidos. O problema é que isso envolve nivelar o discurso por baixo, ter que criar uma mentira de mim mesma, algo que não estou disposta a fazer porque ser famosa é algo muito pequeno em comparação ao que acontece quando uso da literatura e da arte para atingir uma verdade.
Sei que muitos dos meus leitores também têm leitores e achei importante puxar esse assunto porque talvez você também sinta isso. Não é fácil olhar para o lado de fora e ver outros criadores (de vídeos, de texto, de fotos, de quadrinhos, etc) com muito mais evidência fazendo tão pouco – ou às vezes com tanta audiência justamente por ser um babaca ou porque ódio é mais fácil vender.
Um dos problemas no Brasil é que, para alguém conseguir um reconhecimento razoável por seu trabalho, precisa atingir MILHÕES, e são nessas escalas que se mede sucesso num país continental – quando a enormidade do Brasil deveria servir outra lógica, que é ter espaço para todo mundo; mas não é bem isso o que acontece. É preciso massificar.
E talvez você também se sinta sem espaço, batalhando um tanto para no fim das contas só conseguir falar para um grupo pequeno de pessoas, e acabe se frustrando e desistindo pela falta de retorno. Tantas vezes vi gente que produzia conteúdo bacana de repente parar porque realmente não é fácil seguir adiante sem algum estímulo, sem alguém para dar um feedback positivo e nos dizer “poxa isso que você faz é daora, continue por favor”? Quem não quer receber essa aceitação e sentir que fez algo que – uau – outra pessoa entendeu e valorizou? Quem não quer crescer e fazer seu trabalho chegar a mais pessoas?
Há quem esteja disposto a pagar o preço, mas pra mim não compensa chegar a mais pessoas apresentando algo que não faz sentido, em primeiro lugar, para mim mesma. Daí li um post do Seth Godin questionando justamente isso: e se a gente começasse da outra direção? Em vez de primeiro pensar em ficar maior, o que aconteceria se a gente criasse algo relevante e se preocupasse com escala só depois que descobrisse como fazer a diferença?
Pode demorar mais. Pode exigir de você mais esforço e mais paciência. Mas se não estivermos fazendo algo honesto – no sentido de ser verdadeiro com quem somos e com o que realmente queremos fazer – qual é o ponto disso tudo?
Talvez devêssemos parar de olhar um pouco para quem está lá em cima, para quem tem a atenção de milhões, e focar na comunidade que temos à nossa volta. Ela pode ser modesta, pequena, pouco barulhenta, mas é quem nos reconhece por quem somos e pelo que fazemos; é quem viu, em algo que você fez, criou, escreveu, uma verdade que dialogou com a realidade dela. “Ah, eu não sou ninguém, tenho uns vinte leitores só”. Saiba quem são esses vinte. Valorize esses vinte. Mesmo que isso não tenha o mesmo peso – e o mesmo impacto financeiro – de centenas de milhares de pessoas te assistindo, vale MUITO o retorno que alguém te dá por algo que você tirou de dentro do seu coração para fazer, mirando na sua verdade em vez de mirar na audiência a todo custo.
Nós que estamos nesse trabalho de falar com os outros temos uma responsabilidade muito grande. Sei que é legal essa ideia de fazer o que quiser, e criar MINHA ARTE, e que a liberdade artística é tão atraente que isso nem parece um trabalho (“de verdade”), mas isso envolve um compromisso que poucas pessoas estão dispostas a assumir. Porque quando criamos estamos participando de um diálogo – e uma conversa significa necessariamente que há uma pessoa do outro lado. A consciência de que a finalidade do que fazemos é para alcançar uma outra pessoa muda tudo – é uma responsabilidade enorme falar e ser ouvido. Vamos aproveitar essa oportunidade para contar mentiras ou falar qualquer asneira para ter atenção? Acho que não. Acho que somos melhores que isso.
Então, quando bater o desânimo de continuar a fazer algo que não recebe tanta atenção quanto, sei lá, trollar sua mãe cobrindo o quarto dela de silver tape, tente só se lembrar de fazer o seu melhor hoje. Podemos não ter o controle do que vai chamar a atenção ou de como a outra pessoa vai receber o que você fez; mas isso você pode controlar. Você pode sempre fazer o seu melhor.
Às vezes, fazer o seu melhor não é o suficiente. Às vezes, fazer o seu melhor só vai piorar as coisas.
Mas, ao menos, você vai saber que, enquanto estiver tentando fazer seu melhor, você estará fazendo o mais importante: contar a verdade.
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Esses dias recebi um “oi sumida” de um leitor e resolvi atualizar o blog – bem, é verdade que está sem atualização desde o ano passado, como se eu tivesse morrido, mas tenho escrito para caramba no medium, mensalmente escrevo e publico a zine Bobagens Imperdíveis, e frequentemente envio textos novos na minha newsletter. Esse texto, por exemplo, foi originalmente publicado em Uma Newsletter #3, em 1º de abril de 2017. Para receber no seu e-mail, assine aqui.