Para facilitar a aproximação de pessoas interessantes, o afastamento das intolerantes e evitar futuros constrangimentos, climões e surpresas, resolvi escrever um resumo das coisas que defendo & das coisas em que acredito.
Sou feminista. Defendo o fim da opressão às mulheres em todos os aspectos possíveis. Do direito a ter sua voz ouvida ao direito de não ser morta, agredida ou violentada. Do direito ao próprio corpo ao direito de pensamento. Defendo o direito de existirmos.
Sou a favor da legalização do aborto. Defendo que o sistema de saúde acolha e cuide da mulher que aborta nos casos já previstos em lei, tipo, pra ontem.
Entendo e faço sempre questão de bater na tecla de que ninguém tem o direito de dispor sexualmente do corpo da mulher contra a vontade dela. Sexo sem consentimento é estupro, assédio de rua não é cantada e vazar vídeos íntimos de uma mulher também é violência.
Entendo que eu ser cisgênera, heterossexual, branca, magra e sem deficiência não me coloca num espectro oposto ao das pessoas transgêneras ou fora do binário de gênero, lésbicas, homossexuais, bissexuais, negras, indígenas, gordas e com deficiência, mas sim ao lado delas. Nunca no lugar delas, pois esse só pode ser delas, mas do lado que as ouve, do lado que não aceita que sejam discriminadas.
Entendo que mulheres trans são mulheres, e portanto pessoas. Todas as pessoas merecem ter sua identidade respeitada. Entendo que não é da minha conta a identidade de gênero ou orientação sexual de alguém.
Entendo que uma pessoa não vai deixar de existir se ela não se encaixa no padrão, ou em teorias, ou em dogmas religiosos, ou no que determina a lei. Não é da minha conta. Não é sobre mim. Não tenho o direito de condicionar a existência de qualquer pessoa à minha visão de mundo.
Entendo que mulheres negras estão em grande desvantagem e que nem tudo do feminismo que se aplica à mulher branca vai se aplicar à mulher negra. Acredito na importância da visibilidade das pautas específicas e das vozes que as reivindicam.
Fazer parte de uma minoria é um motivo a mais – e o maior de todos – para que eu tenha empatia com pessoas de outras minorias, para entender que, enquanto houver alguém sendo oprimido, ninguém será verdadeiramente livre.
Entendo que algumas pessoas estão mais sujeitas à violência que outras – ou ainda que estão sujeitas a violências diferentes. Entendo que, ao mesmo tempo em que posso estar do lado vulnerável à violência, posso estar do lado que comete alguma violência. Faz parte da minha luta não dar continuidade ao ciclo de violência, ódio e discriminação.
Sou dessas que tenta, com muito custo e todos os dias, não ser parte do problema.
Acredito que ser feminista não me torna perfeita, “do bem” ou imune a erros.
Entendo que o racismo e o machismo são sistemas estruturais enraizados na sociedade e que nos atravessam mesmo sem percebermos. Por essa razão, acredito que cabe a mim fazer o meu melhor para não reforçar, com meus atos ou palavras, os mecanismos de qualquer sistema opressor.
Entendo que vou errar nesse sentido. Mas também entendo que posso aprender, mudar e seguir em frente.
Entendo que é possível mudar de ideia. Tenho o direito de mudar de ideia. Todo mundo tem o direito de mudar de ideia. Todos podem mudar, se até as pedras mudam.
Entendo que a melhor forma de influenciar outra pessoa é sendo, eu mesma, um exemplo que a inspire, para demonstrar com isso que é possível pensar e agir de outra maneira. Por essa razão, evito apontar dedos, entrar em conflito direto ou ficar debatendo. Debater é puro ego.
Sou de esquerda, mas não pertenço a nenhum partido político. Acredito que o principal papel do Estado seja corrigir distorções históricas, proteger as pessoas mais vulneráveis e criar condições que acabem com a desigualdade racial, social e de gênero presente na sociedade.
Sou a favor da legalização e regulamentação das drogas. Sou a favor do casamento civil igualitário. Sou a favor da regulamentação e democratização da mídia. Sou a favor de mais ciclovias. Sou a favor de cotas raciais nas universidades. Sou a favor da desmilitarização da PM.
Sou contra a redução da maioridade penal. Sou contra a pena de morte. Sou contra o porte de armas para cidadãos comuns. Sou contra intervenção militar (plmdds né gente).
Acredito que quando um grupo de pessoas desprivilegiadas ganha mais direitos, eu não estou perdendo nada. Pelo contrário, acredito que a sociedade toda está ganhando. A humanidade não avança enquanto um pequeno grupo de pessoas toma para si todos os privilégios às custas da exclusão e opressão de todo o resto da população.
Sou capaz de conviver com pessoas que pensam diferente, mas incapaz de aceitar que qualquer violência ou discurso de ódio seja, de qualquer forma, justificável. Acredito que usar violência ou reforçar discurso de ódio é admitir a própria derrota.
Acredito que a compaixão é o único caminho possível.
Acredito que somos muito pequenos, muito efêmeros e que a nossa existência enquanto humanidade é apenas um soluço na grande escala do Universo. Não acho provável que a ajuda vá vir de cima; estamos sozinhos no trabalho de lidar com nossas próprias merdas. Só temos uns aos outros.
Entendo que somos uma espécie absurdamente limitada e mal resolvida. E que, por essa razão, é tão difícil para nós aceitar o outro. Mas acredito que, num futuro próximo, essa será a principal adaptação evolutiva que vai separar os que vão ficar para trás dos que irão continuar esse louco projeto chamado humanidade.
Ainda que a sociedade que criamos para nós seja favorável à manutenção das coisas como elas são e das pessoas em seus devidos papéis, acredito que temos o poder de fazer diferente. Não fomos esculpidos em pedra. Não estamos para sempre presos no papel de vítima ou agressor, no de bandido ou mocinho. Não fomos destinados a ocupar determinada posição e repetir os mesmos discursos over and over again através dos tempos.
Se eu não acreditasse nisso, nada do que defendo faria sentido.
Se você não concorda ou já me odeia pelo que acredito, não se preocupe. Primeiro, porque não vou te odiar de volta. Mas, acima de tudo, porque também defendo que o choro, ele é livre.
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Fotografia: Sharon Mattheson-McCutcheon (Equality for All LGBTQ Portraits Project) // Flickr Creative Commons