Se tem uma coisa que não dá para escapar de ser na vida é virgem. Todo mundo nasce sendo e tem gente que fica sendo a vida inteira. Eu já fui virgem há muito, muito tempo atrás, em uma galáxia não muito distante, mas ainda consigo me lembrar razoavelmente bem do que significa viver nesse universo.
O virgem vive em um mundo cercado de apelo sexual. Na TV, nas músicas, nos filmes, nas piadas, nos videogames, nos livros. Não dá para escapar. É como se todos falassem um outro idioma que ainda não ensinaram na escola, mas dá pra aprender o básico da conjugação verbal assistindo o Porn Tube.
Na infância, existe uma curiosidade em relação ao assunto, especialmente porque desafia os adultos, que dizem que isso não é conversa pra criança (e dizer isso é pedir pra elas se interessarem, just saying). Nessa idade, eu tinha uma noção superficial da coisa mesmo sem nunca ter visto um pinto na vida – exceto pelos livros de ciência.
Já na adolescência, o bicho pega: a pressão começa a aparecer e ser virgem vai se tornando um fardo cada vez mais pesado. É claro que isso se manifesta de diferentes formas para garotas e garotos. Para eles, a pressão é no sentido de fazer logo e não correr o risco de ser o último cabaço da turma. Para elas, a pressão é para que seguremos a periquita e esperemos o momento “certo”, a pessoa “certa”, por mais que estejamos doidas pra dar. Para eles, é um teste de virilidade. Para elas, um teste de resistência.
É por isso que o virgem, nesse estágio de sair do casulo, é um coitado tão sofredor que, não por acaso, acaba se tornando um personagem perfeito para comédias e filmes de adolescentes. American Pie é um bom péssimo exemplo do uso desse estereótipo. Na época em que o filme fez sucesso, eu e boa parte dos meus colegas éramos virgens, e, mesmo sendo uma pobre virgenzinha, eu não entendia como podiam gostar de um filme tão boboca. Aquilo era uma tragédia. Bem diferente de filmes como Submarine, que tive a felicidade de conhecer essa semana.
Ok, Submarine não é sobre um garoto meio loser que perde a virgindade. Isso está presente na história, mas é só um detalhe. Submarine conta a história de Oliver, um adolescente meio estranho cheio de devaneios sobre a vida, a morte e outros pensamentos esquisitos, que tem como objetivo transar com sua namoradinha Jordana, uma garota tão estranha quanto ele próprio, e salvar o casamento dos pais, ameaçado por um suposto affair entre a mãe e o vizinho, um guru místico pop star.
Além da narrativa cativante, a forma que o filme (no caso, Oliver, já que o filme é contado do ponto de vista dele) aborda o sexo é no mínimo interessante. O garoto nos conta como ele consegue saber se os pais transaram: se o botão do regulador de luz do quarto está no meio, ou seja, ajustado para ligar a meia-luz, então é porque fizeram. O negócio é que o quarto não fica à meia-luz há sete meses, e Oliver acha isso preocupante.
Oliver tem bons motivos para se preocupar. A menos que os envolvidos sejam assexuais, um bom indicativo de que um relacionamento é saudável é a ocorrência de momentos um-sobre-o-outro (sejam eles casados ou tico-tico-no-fubá). E é aí que entra o outro lado da tal pressão sobre os virgens: se, por um lado, existe uma pressão doentia para que os virgens transem logo, por outro, existe uma pressão para que eles contenham seus desejos e esperem até o casamento. Tá achando que ser virgem é moleza?
Esses jovens casais que não deixam o quarto à meia-luz (até porque, dividir o mesmo quarto, só depois do casamento) também são conhecidos como a tal geração “Escolhi Esperar” – representada pela sugestiva figura de uma mão. Orgulhosos de suas virgindades, seguem determinados na escolha de só inaugurarem seus genitais com as devidas alianças na mão esquerda, porque, aparentemente, é assim que deus gosta de sexo.
Ser virgem é bastante difícil, eu sei, eu já fui. Por isso, é de se admirar quem simplesmente escolhe ser virgem. Cada um deve ter autonomia sobre o seu corpo e fazer suas próprias escolhas, sim; o problema é quando o jovem é impelido a suprimir seu tesão, como se isso fosse torná-lo melhor que as outras pessoas. Ser virgem, assim como transar, não torna uma pessoa superior ou inferior a ninguém. E tudo bem que não deve ser verdade que se você segurar um espirro sua cabeça explode, mas impedir o corpo de suprir suas necessidades fisiológicas, quando existem, não é lá muito saudável.
Não bastasse todos esses problemas cabeludos que os virgens já têm, eles ainda têm a tendência de fantasiar sobre o sexo como se fosse a entrega de um Oscar. O que só complica mais as coisas. Eu já disse algumas vezes que, em muitos casos, o que estraga um filme é uma expectativa muito alta. A mesma coisa vale pro sexo. Quer saber? Aí vai um spoiler (não sobre Submarine, mas sobre a primeira vez): não é nada demais. Não desce nenhum anjo do céu, não tem fogos de artíficio e não se ganha nenhum super-poder. Então pode ser um pouco frustrante pra pessoa que se guarda achando que isso vai tornar o sexo de alguma forma mais especial e fuén.
Oliver, pelo contrário, não tem a menor pretensão de se guardar. E, para convencer Jordana a transar com ele, o garoto faz uma listinha fofa com as razões para eles fazerem sexo.
3 – Se vamos nos decepcionar, por que esperar?
Já dizia a música: façamos, vamos amar. O importante é ter vontade e deixar rolar, sem pressa, sem pressão. Razões pra gente fazer sexo é o que não falta. Razões para ver Submarine também não. A única coisa que estraga esse filme é você deixar de vê-lo.